Vovô Chacrinha...
Quando o vimos pela primeira vez, nosso querido Vovô estava subnutrido e com sérios problemas neurológicos, andando em circulos em uma Rua de Petrópolis, não tínhamos como deixá-lo para trás, naquela época, estávamos com muitos animais, sem nenhum espaço onde pudéssemos acomodá-lo...
Decidimos então levá-lo imediatamente para uma clinica em Itaipava, onde foi sugerida a Eutanásia, não aceitamos a sugestão... Chacrinha, aquele Senhorzinho lutava pela vida desesperadamente, quando oferecíamos comida, nosso novo amiguinho tentava comer, e conseguia se alimentar com a nossa ajuda...
Quatro anos se passaram, Chacrinha NÃO foi eutanasiado, aos poucos foi se recuperando, com uma boa alimentação, muito carinho e todos os cuidados que podíamos lhe oferecer...
Sim, foram QUATRO anos de muito carinho, amor, dignidade...
Minha mãe, que faleceu a oito meses, logo se encantou por aquele Senhorzinho e dava a ele todo o conforto e toda a vida boa que ele merecia ter, e que provavelmente nunca havia conhecido em toda sua passagem por essa vida...
Quando minha mãe adoeceu, sua maior preocupação era com o nosso Velho Guerreiro, ambos tinham uma ligação tão forte e tão bonita, que Dona Cláudia se tornou um exemplo lindo de amor, dedicação, uma amizade linda entre os dois que criava um elo fortíssimo, um grande exemplo que deveria ser seguido por todos nós...
Chacrinha já não estava bem a alguns meses, com o falecimento de sua melhor amiga (minha mãe) nosso Vovô perdeu muito a alegria de viver, ele fazia tudo com a presença dela: se alimentava, ajuda para fazer as necessidades, tudo mesmo...
Poucos dias antes de entrar em coma, minha mãe me chamou e pediu para que eu nunca deixasse que o nosso Chacrinha entrasse em sofrimento extremo... Ela sempre dizia que se pudesse fazer a escolha dela, jamais se submeteria a todo o sofrimento que lhe fora imposto no final de sua vida. Ela implorava para não ficar presa aos apararelhos que lhe prenderam nessa vida até o dia de sua passagem.
Na quarta feira, Chacrinha parou de se alimentar, sua mandibula travou e ele não conseguia movimentar a boca, tentamos de tudo, pastinhas, comidinhas, sopinhas, mas já sabiamos que estávamos entrando num processo onde o final, por mais que lutássemos seria a morte do nosso amigo querido, chegamos a pensar na hipotese de uma sonda para que ele pudesse ser alimentado, mas todos os veterinários deixaram claro que ele não aguentaria a anestesia...
No sábado a noite nosso Vovô piorou muito, tentei então fazer a ultima tentativa de alimentá-lo, Vovô Chacrinha ja estava desidratado, muito fraco e entrando em sofrimento extremo...
Fiquei desesperada, além de sentir a dor da perda de um cãozinho tão querido e especial, perder o Chacrinha, representava para mim a quebra de um grande elo, como se de alguma forma sua presença física fosse também um "link" com a minha mãe...
Lembrei de tudo que aprendi, de tudo que já haviamos vivido, dos bons momentos do nosso "Velho Guerreiro", momentos felizes, correndo, tomando conta do seu território, chamando a minha mãe, tomando conta da porta do banheiro enquanto ela tomava banho, deitadinho ao lado dela na hora de dormir...
E tive a certeza de que o momento havia chegado...
Chacrinha não teria mais uma vida feliz, manter um cãozinho idoso, tetraplégico, com sérios problemas neurológicos Vivo já era por si só um grande milagre, fazê-lo passar praticamente um ano sem escaras de decubito, sempre atento, sempre querido e com aquele brilho no olhar que só mesmo quem sabe que é tão importante tem, já era uma grande vitória...
Precisava levá-lo rápido para uma clinica 24 horas, onde seu sofrimento finalmente chegaria ao fim...
Chegamos ao Cittá Vet por volta de 3 horas da madrugada de sábado, o coração apertado, chacrinha me olhava como se já soubesse que havia chegado a hora e o desespero, o medo, o sentimento egoísta de acreditar que estaria abrindo mão da sua presença física tomava conta do meu coração...
Todos sabem o quanto somos contra a Eutanásia, mas somos também contra o sofrimento extremo, contra a falta de dignidade...
Meu irmãozinho Chacrinha teve seus últimos dias marcados por muita dor, sofrimento, por uma agonia tão forte...
Ver o nosso Velho Guerreiro olhar para a comida e para a água sentindo fome, sentindo sede e não conseguir saciar suas necessidades mais básicas foi uma experiência desesperadora...
Acreditem, eu que já passei por tantas batalhas, que me achava preparada para enfrentar qualquer situação, me vi completamente desesperada, angustiada, impotente...
Ao entrar no Cittá Vet, fiz um esforço absurdo para conter as lágrimas, não queria que a última imagem do nosso Vovô fosse de um olhar triste e desesperado...
Rezei... Pedi a minha mãe, que o recebesse naquele momento, pela primeira vez após sua morte me senti pronta para lhe pedir algo e o pedido era que ela estivesse ali, presente naquele momento... Tive a minha última conversa com o nosso Vovô Chacrinha, explicando que ele iria dormir e que acordaria do lado daquela pessoa que foi o grande amor de sua vidinha...
Muitas vezes me perguntei revoltada, porque eles vivem tão pouco...
Naquela madrugada de sábado, acredito ter encontrado a resposta...
Nós, seres humanos, somos os guardiões do nosso Planeta e de tudo que é sagrado ao nosso redor...
Eles, os animais, precisam muito da nossa presença, dos nossos cuidados...
Chacrinha, se estivesse na natureza, ou se estivesse ficado nas Ruas, não teria vivido mais quatro anos felizes...
Chacrinha nos ensinou tantas coisas, que eu poderia ficar horas aqui escrevendo sobre o assunto...
Mas hoje eu prefiro apenas agradecer ao nosso Velho Guerreiro por cada momento, por cada risada que dávamos quando ele chamava a Dona Claudia (ele já não andava mais) e lá vinha ela, reclamando, resmungando: - Ai Chacrinha o que eu faço com você!!! Depois de velha virei sua escrava!!! Sempre sorrindo, sempre pronta para lhe dar amor e carinho...
Obrigada Velho Guerreiro, por cada momento, por cada instante da sua presença nas nossas vidas.
Que agora, nesse momento, você esteja ao lado da minha mãe e que estejam felizes por estarem novamente juntos...
Sim, eu te libertei de toda a dor e sofrimento...
Atendi ao seu pedido mesmo sabendo que não sou Deus e que estamos longe disso...
Com todas as limitações que nós seres humanos temos, tenho certeza que fiz a escolha certa no momento certo, eu jamais me perdoaria se te visse agonizando, dando os ultimos suspiros sem ter ao menos algo que amenizasse a sua dor...
Chacrinha partiu na primeira dose do anestésico...
Apesar de ter levado o nosso Vovô para fazer Eutanásia, ele não resistiu nem a primeira dose do anestésico, dormiu como um anjo, sentimos sua mandibula relaxar...
Na segunda dose do anestésico seu coração ja estava parado...
Hoje, venho pessoalmente agradecer a todos os amigos que torciam tanto pelo nosso Vovô, são muito poucas as pessoas que verdadeiramente se mostram dispostas a ajudar um cãozinho idoso, normalmente todos ocupam os espaços de seus corações com os jovens, com aqueles que "ainda tem alguma chance", mas Chacrinha era tão especial, que conquistou amigos muito especiais dentro do G.A.R.R.A. - obrigada Vera, Lis, Sandra, Rita, Adriana, Renata, Erich, Sérgio, Rosa e Duda, Lívia...
E um obrigada muito especial a pessoas que se fizeram presentes em sua vidinha: Daniela Calainho, que passou um bom tempo da madrugada de sábado me escutando angustiada e que imediatamente se disponibilizou a arcar com a despesa do atendimentod e emergência no Cittá Vet (pois nossas contas estão zeradas e com a dívida na clinica os atendimentos de emergência ficam suspensos se não forem pagos na hora), Obrigada a Dra Lucila Malosá, por ter feito um trabalho voluntário maravilhoso, doando as sessões de acupuntura que melhoraram tanto a qualidade de vida do nosso Vovô... Obrigada a Dra Andréa que nos atendeu naquela madrugada, demonstrando ser uma excelente profissional e acima de tudo, um ser humano digno da nossa admiração... e finalmente, obrigada a Adriana, por ter, mais uma vez, ficado do meu lado até o ultimo instante...
Peço desculpas se esqueci de citar algum nome e peço também a todos que se lembrem do Velho Guerreiro feliz, caminhando sem precisar da ajuda de ninguém...
Acreditem, se pudesse voltar no tempo e fazer tudo de novo, não pensaria duas vezes e o faria...
Cada momento valeu a pena e se estou aqui, nesse momento compartilhando a minha experiência, minhas emoções e sentimentos com os nossos amigos, é porque eu tive a oportunidade de viver momentos maravilhosos e de fazer a diferença no dia a dia do nosso querido Vovô Chacrinha.
Fica aqui a sua imagem, sorrindo, feliz e muito amado e querido por todos da Família G.A.R.R.A.
Seja feliz Vovô Chacrinha, o Céu está em festa e o motivo é a sua chegada...
Até breve...
Com amor,
Renata Prieto